quarta-feira, 30 de maio de 2018

Amazonia, laboratorio global


Descoberta na Amazônia enzima para fabricar etanol de segunda geração
Com informações da Agência Fapesp -  14/05/2018







Descoberta na Amazônia enzima-chave para obtenção do etanol de segunda geração, ou etanol celulósico.[Imagem: Beta-Glucosidase Amazônica]


Etanol de celulose
A produção do etanol de segunda geração, ou etanol celulósico, obtido a partir da palha e do bagaço da cana-de-açúcar, pode aumentar em até 50% a produção brasileira de álcool.

Nosso país possui a melhor biomassa do planeta, a capacidade industrial instalada, a engenharia especializada e a levedura adequada.

Mas ainda falta completar a composição do coquetel enzimático capaz de viabilizar o processo de sacarificação, por meio do qual os açúcares complexos (polissacarídeos) são despolimerizados e decompostos em açúcares simples. Compor uma plataforma microbiana industrial para a produção do conjunto de enzimas necessárias é o alvo de todas as pesquisas na área.

Um importante resultado acaba de ser alcançado com a descoberta de microrganismos naturais capazes de produzir uma enzima crítica para o êxito do empreendimento. A descoberta foi feita no lago Poraquê, no município de Coari (Amazonas), próximo do Terminal Solimões da Petrobras.

O estudo contou com a participação de pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), da Petrobras, da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

Enzima para fabricar etanol
Isolada, caracterizada e produzida, a enzima mostrou-se compatível com duas fases essenciais da produção do etanol de segunda geração: a fermentação e a sacarificação. A realização simultânea dessas duas etapas oferece a perspectiva de uma grande redução de custos para a indústria sucroalcooleira, uma vez que as reações podem ocorrer em um único reator e com economia de reagentes.

"A sacarificação é a etapa mais cara do processo. De 30% a 50% do custo do etanol celulósico é despendido com as enzimas necessárias para transformar os açúcares complexos em açúcares simples. E, atualmente, a eficiência da conversão realizada por essas enzimas está entre 50% e 65%. Isso significa que de 50% a 35% do açúcar disponível na biomassa é 'perdido' durante a sacarificação. O grande propósito do nosso estudo foi encontrar biocatalisadores capazes de contribuir para o aumento da eficiência", disse Mário Tyago Murakami, um dos coordenadores da pesquisa.

Segundo o pesquisador, no arsenal de enzimas necessárias, atuando de maneira sinérgica, as beta-glucosidases têm importância fundamental, porque respondem pela última fase da cascata de sacarificação da celulose.

"Sabemos que, à medida que aumenta o percentual do produto da sacarificação, a taxa do processo de sacarificação cai porque a presença do produto inibe a atuação das enzimas. Isso é uma espécie de regra geral. No caso específico, a glicose gerada restringe a atuação das beta-glucosidases. Esse gargalo tecnológico tem sido objeto de estudos exaustivos. Para aumentar a eficiência da sacarificação, é preciso que as beta-glucosidases sejam altamente tolerantes à presença da glicose", disse Murakami.

Devido a especificidades genéticas, decorrentes de diferenças no processo evolutivo, enzimas homólogas podem apresentar variados graus de resistência à inibição pelo produto.

Por isso os pesquisadores partiram para um esforço de bioprospecção, procurando as beta-glucosidases mais adaptadas à biomassa existente no território brasileiro. Para isso, foram investigados os processos naturais que ocorrem em diferentes biomas do país, tanto na Floresta Amazônica como no Cerrado.

Alimentação de celulose
O achado mais promissor ocorreu no lago Poraquê, onde amostras da comunidade microbiana não cultivável local apresentaram genes codificadores de beta-glucosidases com o potencial industrial procurado.

"Em um habitat como o lago Poraquê os microrganismos adaptaram-se a uma alimentação muito rica em polissacarídeos, constituída por resíduos de madeira, folhas de plantas e etc. A enzima beta-glucosidase presente nesses microrganismos é distinta de enzimas homólogas resultantes de pressões evolutivas diferentes", disse Murakami.
O próximo passo será fazer estudos de combinação dessa enzima com os coquetéis enzimáticos fúngicos já existentes, visando o ganho de eficiência no aumento da sacarificação.

"Uma vez extraído o gene de interesse, a partir de bibliotecas gênicas de microrganismos não cultiváveis e de possíveis modificações racionais baseadas no conhecimento da estrutura para aumento de termoestabilidade, ele é transferido para outros hospedeiros por meio de técnicas de biologia molecular. O hospedeiro em questão é o trichoderma, um fungo filamentoso que já possui um arsenal de enzimas ativas sobre carboidratos. Com a adição da beta-glucosidase amazônica, ele terá seu potencial aumentado. Trata-se de potencializar uma plataforma microbiana industrial já existente", disse Murakami.
Bibliografia:

A novel β-glucosidase isolated from the microbial metagenome of Lake Poraquê (Amazon, Brazil)
Danyelle Toyama, Mariana Abrahão Bueno de Morais, Felipe Cardoso Ramos, Letícia Maria Zanphorlin, Celisa Caldana Costa Tonoli, Augusto Furio Balula, Fernando Pellonde Miranda, Vitor Medeiros Almeida, Sandro Roberto Marana, Roberto Ruller, Mario Tyago Murakami, Flavio Henrique-Silva
Biochimica et Biophysica Acta - Proteins and Proteomics
Vol.: 1866, Issue 4, April 2018, Pages 569-579
DOI: 10.1016/j.bbapap.2018.02.001


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